O último Banquete da Monarquia
Realizou-se no dia 3 de outubro de 1910, no Palácio de Belém, o último banquete no qual D. Manuel II esteve presente enquanto Chefe do Estado.
Tive a sorte de poder adquirir recentemente, em leilão, o Menu deste repasto que já conhecia da história. O menu é impresso em papel/cartolina fina branco, com impressão a relevo e dourado das Armas de Portugal. A digitalização agora apresentada não é de boa qualidade, mas espero, em breve, poder substituir esta ilustração.
Este banquete decorreu num período delicado para o Rei D. Manuel pelos movimentos políticos que aconteciam para instalação da república, o que aconteceu dois dias depois. Por outro lado, também nos podemos questionar sobre a escolha do Palácio de Belém em vez do Palácio da Ajuda onde habitualmente decorriam as refeições de estado. Possivelmente a escolha se deva ao facto de Hermes da Fonseca (1855-1923) já ter sido eleito, mas apenas a 15 de novembro assumiu a chefia do estado (1910-1914), portanto uma possível escolha protocolar. Hermes da Fonseca ficará na história como o último chefe de estado que esteve com o último rei português e, em simultâneo, o primeiro chefe de estado estrangeiro em contacto com os início da República Portuguesa, tendo sido recebido por Bernardino Machado, na altura Ministro dos Negócios Estrangeiros do Governo provisório.
Menu
e sua Transcrição:
Consommé double Royal
Créme Brésilienne
Saumon de l’Adour à l’Ecossaise
Escalopes de ris de veau Francillou
Cuissot de chevrenil Moscovite
Purée de Marrons
Suprème de poularde Amélie
Marquise au Porto
Faisans de Bohème sur canapés
Coeurs de Romaine
Asperges Argenteuil-Sauce Aurore
Corbeille de fruits glacés
Gateaux São Paulo
Panier de friandises
Desserts
Yerès sec, Hochheimer 1900, Médoc, Beaune 1899, Pommery et Greno extra sec, G. H. Mumm Drapeau Americain, Old Port 1815 *, Vieille fine Champagne Gauthier
*Segundo o notável escanção, e Master de Vinho do Porto, Octávio Ferreira: “O Porto de 1815 foi o mais histórico e valioso do século XIX”.
Não me vou deter com os possíveis erros de caligrafia e denominações, possivelmente, mal atribuídas. Como era hábito incluir no menu alguns pratos para homenagear o convidado principal ou circunstâncias associadas, encontramos o “Créme Bresilienne” e o “Gateaux São Paulo”. Possivelmente também o “Suprème de poularde Amélie” constava do menu invocando a Rainha mãe D. Amélia.
D. Manuel II tinha próximo de si todas as altas chefias militares e policiais. O ambiente era tenso pois havia notícia das manifestações populares e de alguns militares. Parece que D. Manuel II terá escrito no menu que entregou ao servidor de proximidade: “Peço-lhe o favor de mandar apressar um pouco o jantar”, segundo relato no blogue do Casal Mistério.
D. Manuel recolheu-se no Palácio das Necessidades e, no dia seguinte foi para o Palácio de Mafra onde se encontrava a restante Família Real e dia 5 partiram de Mafra para a Ericeira onde embarcaram, para o exílio, a bordo do iate Amélia.
Ainda sobre o banquete escreveu Ana Marques Pereira, no seu livro Mesa Real. Dinastia de Bragança, Edições Inapa, 2000, “Foi no início do jantar que se divulgou a notícia de que a revolução republicana estava na rua. Algumas pessoas abandonaram o local. Os criados iam retirando apressadamente os talheres e afastando os pratos, para não se notarem as falhas. No final D. Manuel regressou ao Palácio das Necessidades, de onde partiu no dia seguinte para Mafra. …”
© Virgílio Nogueiro Gomes