Queijadas de Murça

 

 

 

 

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Queijada de seu nome, de Murça a sua origem. De uma queijada espera-se por um doce no qual o queijo parece ter um papel importante, um dos seus ingredientes; nem sempre! Costumo dizer que as grandes exceções de queijadas são as de Murça e as Donas Amélias dos Açores.

Curiosamente as Queijadas de Murça, supostamente oriundas do Convento de S. Bento, e não cozem em formas. Faz-se uma massa com farinha, ovos, banha, água e sal. Deixa-se repousar e depois estendem-se com um rolo, e recorta-se em círculos sobre os quais se coloca o creme. Estes círculos são ligeiramente puxados em cinco pontas para criar uma caixa para receber o recheio. Este é preparado com gemas de ovo, doce de gila, amêndoa ralada, açúcar e canela. Vão ao forno cozer e depois passam-se por uma calda de ponto de pérola e deixam-se secar

No meu Dicionário Pratico da Cozinha Portuguesa, 2015, defino queijada como Termo genérico para doces feitos em formas de queque nos quais um dos ingredientes é o queijo. Exceção para as queijadas dos Açores, que não levam queijo, assim como as de Murça. Podemos encontrar queijadas com massa externa e, esta, depois recheada, ou queijadas que não têm massa externa e o creme coze diretamente na forma.

 

 

 

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As queijadas, possivelmente as mais antigas serão as de Sintra, bem historiadas por Raquel Moreira no seu livro “Queijadas de Sintra”, são um docinho que dura alguns dias e que varia de acordo com várias tradições locais. Com queijo, leite coalhado, queijo coalho ou requeijão parece ser o elemento comum que lhe daria a designação às diferentes queijadas. Nas Queijadas de Sobral, Brasil, podemos assumir que as atuais são fruto de “fusão”. Na sua simplicidade apenas levam quatro ingredientes: farinha triga, açúcar, ovos e queijo fresco. A canela é também usada. Em Sobral, as Queijadas apresentam-se de forma diferente. A caixa exterior aperta-se sobre o creme como que a formar um bolo homogéneo. Também aqui substitui-se o queijo fresco por queijo coalho, o coco ralado substitui a amêndoa e adiciona canela. Para comparar leia-se o livro “Doces Sabores” de Rosa Belluzo e Marina Heck publicado pelo Studio Nobel.

As Donas Amélias, chamadas de queijadas por tradição local, são seguramente as queijadas com o aspeto mais diferente de todas as queijadas. Segundo a Câmara Municipal de Angra do Heroísmo as Donas Amélias são um doce conventual terceirense e foi adaptado a uma receita que já existia, o bolo das Índias, que é confecionado também com especiarias... De facto, são uns bolinhos com a forma de queques sem massa exterior de suporte, e a utilização de especiarias garantem-lhes um período mais longo de conservação.

 

 

 

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Assim, e voltando às Queijadas de Murça, também são estas de origem conventual com a particularidade de a sua massa ser semelhante ao doce mais emblemático de Murça que é o seu Toucinho do céu. A massa exterior não é alta e cozida em forma, mas uma placa que dá suporte a um recheio, massa do toucinho do céu. Neste caso, a massa externa, é preparada farinha, ovos, água, sal e gordura para dar elasticidade. O seu recheio é, a exemplo do toucinho do céu, confecionado com açúcar, gemas de ovo, doce de chila, amêndoas e canela. A receita está nas mãos das doceiras de Murça. Especial referência a Dona Zezinha, guardiã do manuscrito saído do convento. O Convento de São Bento de Murça foi criado por vontade de Simão Guedes, nono Senhor de Murça, na segunda metade do século XVI como um albergue para acolhimento de viandantes peregrinos e para assistência de pobres e enfermos. Mais tarde pediu aquele senhor licença à Santa Sé para transformar o albergue em convento e solicitou aos superiores da Ordem Beneditina o envio de religiosas para dar início a uma nova comunidade. O novo convento continuou com a obra assistencial do albergue, designadamente tratar dos enfermos e servir refeições aos pobres, e aumentou as suas funções acolhendo senhoras e instruir e educar raparigas. Foi com esta nova atividade do convento que se terá desenvolvido um apuramento das artes culinárias e possivelmente porque os seus instituidores viviam ao lado, mantendo a capela, comum ao convento, e que aos senhores serviria como jazigo da família. Ora será desta última fase que se espalhou uma nova forma de receber nas casas mais abastadas, sendo fácil na região ainda associarem algumas receitas à sua origem conventual. Uma das últimas criadas do convento, Serafina Rosa Alves, teria reunido num caderno as receitas principais tendo doada à sua afilhada Hermínia Alves o citado caderno. A sua filha, Maria José, a Zezinha como é conhecida, é a atual proprietária da “Casa das Queijadas” e com quem tive uma agradável conversa.

 

 

 

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Diz-se em Murça que estas queijadas, à semelhança do Toucinho do Céu, seriam a única iguaria a oferecer a Jesus Cristo, caso Ele voltasse a este mundo.

Visitem Murça e não percam a oportunidade de se deliciarem com os seus doces.

© Virgílio Nogueiro Gomes

 Todas as fotos são da:

Casa das Queijadas

Praça 31 de janeiro, 13

5090-134 Murça

TL 259 511 386

 

 

 

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Porta do que foi o Convento de São Bento, em Murça