La Cuisinière Bourgeoise
Este é o título de um livro escrito por Menon e cuja primeira edição surgiu em Paris em 1746. Do seu autor sabe-se pouco apesar de ter escrito, pelo menos nove livros conhecidos: “Nouveau Traité de Cuisine”, 1739, “La Nouvelle Cuisine”, 1742, “La Cuisinière Bourgoise”, 1746, “La Science du Maître d’ Hôtel Cuisinier”,1749, “Le Maître d’Hôtel Confiseur”, 1750, “Les Soupers de la Cour”, 1755, “Cuisine et Office de Santé” 1758, “Traité historique et pratique de la Cuisine”, 1758 e “Manuel des Officiers de Bouche”, 1759. (1) No “Dictionnaire du Gatronome”, 2008, de Jean Vitaux et Benoît France, escrevem: Se as obras de Menon são célebres, a sua vida é completamente desconhecida. Outros autores se referem a Menon da mesma forma. Sobre a sua obras e a sua importância é incontestável a sua modernidade para a época e as edições repetidas durante os séculos seguintes, sem alterações. Diria mesmo que os seus escritos revelam uma modernidade surpreendente. E parece consciente desse detalhe quando escreve que, preocupando-se em desenvolver o trabalho da nova cozinha, não pode desligar da cozinha antiga que lhe serve de base. Curiosamente no livro “La Cuisinière Bourgeoise”, inicia com a frase: seguirei a ordem das estações do ano, conceito da nova cozinha de finais do século XX e passagem para o XXI. Em 1752 publica um segundo volume, mas em 1753 um editor de Bruxelas organiza uma edição com os dois volumes concentrados em um só, diminuindo o tamanho da letra. Terá havido uma polémica de contrafação sobre esta obra que o autor foi denunciando.
Primeira página da edição de 1786
La “Cuisinière Bourgeoise” pretende oferecer ao público uma cozinha reconhecida de origens modestas, mas que as que as grandes mesas procuram, sendo do gosto dos grandes Senhores, principalmente daqueles que têm cuidado com a saúde, ... e servir uma boa mesa burguesa.
Depois do que me parece serem as primeiras receitas com a designação à Portuguesa em livros estrangeiros, em Francisco Martinez Montiño, 1611, e que podem ler clicando aqui, eis o segundo livro que estudei. Ora, neste livro, “La Cuisinière Bourgeoise” de Menon, 1746, vamos encontrar 4 receitas à la Portugaise que despertaram a minha curiosidade. Apresento as receitas na versão original e depois, a receita traduzida.
Creme à Portuguesa
Com um quartilho (meio litro) de boas natas, juntar meia colher de café com água de flor de laranjeira e meio quarteirão de açúcar (64 g), dois ovos completos e bater bem até obter uma massa espessa; colocar numa compoteira em prata. Colocar sobre cinza quente e cobrir com uma tampa de torteira e calor por cima; quando estiver pronta colocar a compoteira a arrefecer sobre gelo, ou em local frio até ser servido. (A cozedura será em forno brando)
Imagens de Creme à Portuguesa
A primeira questão para esta receita foi encontrar tabelas de conversão das quantidades da época para as atuais. Para a execução, e confirmação das quantidades, contei com a colaboração do excelente chefe de Pastelaria Joaquim Sousa (JNçQUOI e La Durée Lisboa). A grande incógnita é saber a razão por que se chamava à portuguesa! Em 1838, J. J. Machet no seu famoso livro “Le Confiseur Moderne ou L’ Art du Confiseur...” tem uma receita em tudo igual à de Menon mas chama-lhe à italiana! No caderno de receitas do Mosteiro de Odivelas, agora com nova leitura de Maria Máxima Vaz, deparamos com uma receita de Creme à Italiana ou Tabefe, que não usa natas, mas leite e adiciona canela. Será que a receita de Menon dará origem ao Crème Brulée? Durante a prova sentimos um doce muito macio e um agradável arrière gout a flor de laranjeira. Não me parece que este creme seja, só por si, uma sobremesa, mas um creme para juntar a outros elementos para constituição de uma sobremesa.
Compota de maçãs à Portuguesa
Pegue em maçãs reineta em quantidade para encher a compoteira, e retirar o meio com um descaroçador ou uma faca, colocar as maçãs num tabuleiro ou prato de prata, colocar no meio de cada maçã um pouco de açúcar ou açúcar em pó, e também no fundo do prato. Levar a cozer ao forno. Servir quentes polvilhadas com açúcar em pó. Esta receita é incluída num menu de Table de douze Couvert à dîner, com o famoso serviço à francesa. (trata-se, de facto, de “Maçãs assadas” e que deveriam ter água também no tabuleiro)
Compota de damascos à Portuguesa
Tomar a quantidade que se queira de damascos quase maduros, cortar em metades e tirar o caroço; colocar açúcar no fundo de uma caçarola com meio copo de água, colocar os damascos por cima e colocar em lume baixo para levantar fervura até que fiquem cozidos por baixo e quase sem molho; depois retirar do lume e cobrir com açúcar em pó, levar ao lume com uma tampa até que estejam cozidos e com uma bela cor cristalizada, deitar ainda quente dentro de uma compoteira.
Compota de pêssegos à Portuguesa
Colocar sete ou oito pêssegos numa caçarola com açúcar por baixo e por cima, cobrir com tampa e levar a cozer com lume por baixo e por cima (forno?); quando estiverem cozidos e bem cristalizados, servir quentes.
O termo compota quereria significar a confeção de frutas frescas com açúcar.
Digitalizações do livro com leitura deficiente para não estragar o livro original, encadernado.
© Virgílio Nogueiro Gomes
- Fonte – Livres em bouche, Bibliotèque national de France, 2001