Polvo, Polvinho, Polvozinho…

 

 

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Polvo é um molusco marinho com oito braços que partem da zona da cabeça e cobertos de ventosas. A imagem de um polvo tem qualquer coisa de fantasmagórico. Lembra aventuras nas profundezas do mar, e sempre com um aspeto dominador. Talvez por isso haja expressões populares associadas ao polvo pelos seus vários braços e ramificações.

A tradição de comer polvo fixou-se, inicialmente, em zonas do litoral e depois em várias zonas de interior pela facilidade de conservação. O polvo era seco e, depois, quando necessário ao consumo, era mergulhado em água por umas horas, antes de ser confecionado. Talvez por isso vamos encontrar ainda hoje uma receita de polvo guisado em Mirando da Douro. O polvo é também popular em feiras, que seco, é grelhado em brasas e depois anda a ser mastigado pela feira.

Mas associado ao polvo estão as várias “pistas” para ser cozido ficando tenro. Há quem afirme que a introdução de rolhas de cortiça na água de cozedura resolvem a questão, como há outros que o batem numa pedra com força várias vezes, outros que colocam casca de cebola, e os mais modernos que consideram a panela de pressão o instrumento maravilha. Muitos cozem o polvo em panela até que o polvo a encha. Depois acrescenta-se um pouco de água e fica a cozer lentamente. Ou o método de cozedura lenta a temperatura baixa. E a tradição de cozer ovos inteiros para alegrar a pequenada, pela cor rosada que apresentam no fim da cozedura.

 

 

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Polvo

Recentemente é fácil apresentarem-nos, nos restaurantes, polvos pequenos ou miniaturas e, por isso, tentei descobrir qual o diminutivo para polvo: polvinho, polvozinho…? Não descobri. Na região de Olhão, onde existe uma vasta tradição de pesca e consumo, disseram-me que quando o polvo é pequeno se chama localmente polvo mijão…

Fui educado em Trás-os-Montes e o polvo era sempre generoso em tamanho, e depois com frequência íamos a Espanha (e muitas vezes à Galiza) onde se mantinha a tradição de polvo grande que eu achava o polvo “normal”. E comia-se muitas vezes em filetes apenas possíveis em braços grandes. E na Consoada, cozido! Polvo que se come com talheres de carne. Possivelmente, as formas mais comuns de confecionar o polvo passam por cozê-lo, ou grelhá-lo. Agora até à “lagareiro”. Depois há o polvo guisado e com duas receitas especiais em Miranda e nos Açores. No Minho há também uma tradição de o confecionar guisado. Mas no norte e Porto os filetes de polvo são um contributo para a identidade regional à mesa, e muitas vezes com arroz do mesmo. Por proximidade não podemos esquecer o “Polvo à galega”.

 

 

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Filetes de polvo

Tentei perceber se os polvos pequeninos que nos servem serão de uma “raça” pequena, se são os polvos tradicionais em idade infantil, sem sucesso. Busquei nas definições legais e não me apareceram os polvos miniaturas. Será que se andam a pescar polvos antes do seu tempo de crescimento?

Na obra O Pescado na Alimentação Portuguesa, de Fernando M. d’Almeida e H. Marina L. Martins, publicada pelo Instituto de Formação Turística em 1982, e com segunda edição em 1997, apresenta apenas uma categoria de Polvo (Octopus vulgaris) com a informação de tamanho do polvo entre 30 e 80 centímetros. Também no livro Poissons et Fruits de Mer de France, publicado pela Sopexa, S/D, apresenta o polvo com a mesma dimensão. Ainda no The Tio Pepe Guide to the Seafood of Spain and Portugal, de Alan Davidson, 2002, o polvo surge com a dimensão de 40 a 100centímentros. Neste livro há a seguinte referência: “Os portugueses gostam de polvo com arroz”.

A título de curiosidade transcrevo a definição de polvo no Diccionario da Lingua Portuguesa, de António de Morais Silva, 1831: “Peixe de muitas pernas, com umas excrecencias redondas, pelas quaes  se afferra nas pedras, as quaes chamão olhos de polvo.”

 

 

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Polvo quase grande

São atribuídas funções inteligentes aos polvos. Consta que trinta por cento dos neurônios do Polvo estão no cérebro. Parece que estes animais desenvolveram grande inteligência por necessidades de sobrevivência. Por isso também dispõem de um sistema de disfarce para enganar os seus predadores, e também para mais facilmente caçarem.

Recentemente, em 2021 foi realizado um estudo, por Robin Crook, que reconheceu que os polvos podem sentir dor psicológica de forma idêntica aos mamíferos. Parece ter sido a primeira prova desse comportamento encontrada num animal invertebrado.

Volto à minha questão que é saber se os polvo, miniatura, que modernamente se servem em restaurantes serão uma espécie natural ou se serão polvos que estariam em crescimento até chegaram a uma idade mais adulta. E, por isso, parece-me que seria uma boa informação ao consumidor, quando nos sugerem polvo que na sua denominação tenha a informação de ser “polvinho”, “polvozinho” ou polvo “miniatura”. Ora nas definições que encontrei em Portugal o polvo necessitaria ter no mínimo 30 cms… Ora o que nos servem são inferiores! Será que seria oportuno ter um período de defeso para a captura de polvos?

 

 

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Polvinho, dito à lagareiro

Por favor, nos restaurantes informe na ementa quando o polvo for miniatura. Há bons restaurantes em Lisboa que servem o polvo à moda do norte ou da Galiza: polvos adultos, e bem tenros.

© Virgílio Nogueiro Gomes

 

 

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Carpaccio de polvinho

 

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 Polvinho, Polvozinho ou Polvo miniatura

 

Recebi, a propósito desta crónica, um email do Ilustre Chef Bertílio Gomes um comentário que me parece oportuno transcrever:

"Acrescento para memória futura, Polvo assado (polvos de 5 a 6kg) no forno diretamente no tabuleiro regado com azeite e aromáticos a gosto (cebola, alho, tomate, ramo de salsa e louro) cobrir o tabuleiro com tampa ou folha de alumínio e levar a 200º  1h30 (é o melhor polvo) não necessita de água para ser assado, no final de assado vai resultar cerca de 70% de polvo ficar em água.

Nota: nunca temperar de sal e a congelação é a melhor forma de destruir a estrutura muscular para ficar tenro."

Obrigado Bertílio!