Sustentabilidade e Alimentação

Nunca se utilizou tanto como agora a palavra “sustentabilidade”. Há palavras que, inesperadamente, entram no vocabulário de notícias e muitos se aprontam a utilizá-las para mostrarem atuais ou na moda. Será que a maioria sabe o verdadeiro significado do palavrão do qual se orgulham usar? Descansem que não serei eu o dicionarista dessas palavras. Infelizmente este termo surge como “parangona” política ou tentativa de discurso novo dos políticos. E porquê esta necessidade. Pelo abandono de uma educação chamada antiga, mas que tinha resultados. O facilitismo de materiais e desinformação generalizada é preciso, de facto, falar em sustentabilidade. Só se fala em sustentabilidade porque se deixou de olhar para a economia doméstica, faltar e tempo e, sobretudo, encadear a educação com os novos propósitos de vida.

Apetece-me, e gosto muito, de abordar as questões da sustentabilidade. E em especial da alimentação, atividade a que estamos destinados desde que nascemos. Comer é preciso! Lembro-me que há uns anos o chef americano Dan Brown dizia que o verdadeiro e autêntico restaurante do futuro seria aquele que conseguisse produzir todos os ingredientes para a sua cozinha. Parecia uma utopia! Várias experiências foram feitas e a chef Beth Beltrão de Tiradentes, Brasil, confirmou-me que no seu restaurante Viradas do Largo, setenta por cento dos seus ingredientes culinários são por ela produzidos.

 

 

 

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Agora vejamos onde a educação era determinante. Até há duas gerações, e particularmente no interior do país, não se sabia o que era desperdício alimentar. E se havia sobras de alimentos havia uma solução prática de transformar essas sobre em curiosas e agradáveis soluções alimentares. E o melhor exemplo é o pão. Com a sacralização do pão, o pão seria um pecado ser esbanjado, ou entregar ao lixo qualquer pedaço de pão. Assim criou-se um receituário de pão que faz verdadeiros emblemas culinários. Que dizer das açordas, das sopas secas, dos ensopados e até do pudim de pão? E agora a volta à produção artesanal de pão e a utilização de cereais que repentinamente foram abandonados. Este gesto de fabricar pão em casa também tem a ver com o excesso de produção industrial ou o abandono de fabricação a partir de massas mães. O exagero de mixes, farinhas compostas às quais apenas se junta água, levaram a este pequeno entusiamo para fazer pão em casa. Com a pandemia até ajuda a passar o tempo!

 

 

 

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Atualmente o discurso da sustentabilidade não pode ser só virado para os consumos energéticos ou produção industrial dos alimentos ou seus derivados, ou alimentos geneticamente alterados. Com o discurso pode ler-se ao regresso, em voz baixa, a tradições ancestrais que garantiram a excelência das nossas cozinhas regionais. Não é só pelos produtos que conhecemos a sua origem como alguns processos de conservação e confeção culinária. Temos de reaprender, e selecionar os conhecimentos, ou práticas, dos nossos antepassados. Quantas vezes sabíamos ao almoço o que comeríamos ao jantar: o pote de três pés ficava em cozedura lenta, e a baixa temperatura, o que agora parece uma descoberta ou uma intelectualidade de alguns chefs. É só aprender com essa sabedoria de anónimas cozinheiras que faziam da economia doméstica uma arte de sobrevivência, e o garante de uma grande poupança. O passado como alicerce do futuro!

 

 

 

 

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O verdadeiro exemplo é não haver restos de cozinha. Tudo se pode aproveitar ou dar um destina mais justo. Já experimentaram aproveitar as cascas das batatas. Antes de as cozinhar devem ser bem lavadas e depois descascar. Estas cascas podem ser fritas que darão um bom aperitivo, e podem ser condimentadas. A cascas têm um valor alimentar importante. A questão é instalar e praticar princípios de não haver sobras. E à mesa deixar o prato limpo. Eu continuo a ficar embasbacado com a quantidade de comida que se coloca nos pratos, em buffets, e que nunca terminam. Aqui são verdadeiramente restos. E aqui volta novamente a questão educacional. Só colocar no prato a quantidade que realmente vamos consumir. É preferível colocar pouco e ir várias vezes ao buffet.

Ir para a cozinha a pensar, é o que falta a muita gente!

Aprendam a não desperdiçar comida.

© Virgílio Nogueiro Gomes

Parte deste texto foi inicialmente publicado na revista InterMagazine nº 267, JAN-MAR 2020

 

 

 

 

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