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É inquestionável que a Natureza tenha produzido os alimentos mais importantes que ajudam à identificação de uma região, ou país, no sentido gastronómico. E a perenidade desses produtos é que terá determinado o seu consumo, e ajudado a instalarem-se como emblemas alimentares dessas regiões. Esse processo de explosão da Natureza, a intervenção do homem criando a agricultura organizada, a modernidade dos regadios, e outras influências demoraram séculos a fixar determinados produtos que hoje fazem parte dessa identidade regional. No entanto as populações habituaram-se a consumir esses produtos nas épocas em que a Natureza naturalmente os produzia. Não havia conservação. Esta limitava-se a algumas leguminosas por secagem. Depois apareceram também formas de confeção que permitiam um prolongamento de vida útil aos alimentos. Por isso surgem os escabeches, as empadas ou pães recheados, e as frituras simples de peixes, e depois com polme. Claro que por secagem ou pelo fumo se aprendeu também a conservar os alimentos. Naqueles tempos comia-se apenas quando a Natureza queria e com a vantagem que eram os períodos em que os alimentos tinham a seu melhor sabor. Agora, com os avanços tecnológicos e a globalização de uma forma geral, é possível comer durante todo o ano a maioria dos produtos alimentares. Mas é tão triste quando chegam os morangos acompanhados do açucareiro! E ainda a propósito de fruta, porque se mantém a designação “Fruta da Época” quando a maioria dos locais tem a mesma fruta, constante, o ano inteiro? Cada época tem as suas frutas. E quase não precisa de mão-de-obra. Claro que outros tipos de conservação se foram inventando e se aceitando como tal: por secagem, por fumagem e por salga seriam os primeiros. Mais tarde vieram as conservas com os produtos confecionados.

Os produtos frescos, quer dizer os colhidos e sem qualquer tipo de conservação, parecem colher os aplausos de todos. E antigamente era gesto automático consumir fresco, direto, e fácil. Não havia congelação e que continua a ser a grande questão interrogatória nos restaurantes. Certo, no início a congelação poderia não garantir todos os cuidados para um produto final igualável. Hoje em dia, por exemplo, já se faz congelação em alto mar o que parece garantir um produto com características semelhantes às do produto fresco em qualidade. Obrigatoriamente deve ter um processo de descongelação cuidado.

Os prazeres dos produtos frescos estão mais associados aos legumes e frutas. Depois da força do calor e no capítulo dos legumes temos, e por ordem alfabética, as abóboras, a aboborinha (curgete), as acelgas, o agrião, o alho-porro, a batata nova, as beldroegas, a beterraba, os brócolos, a cenoura, as couves de Bruxelas, a couve Lombarda, a couve Portuguesa, os espinafres, o feijão-verde, os grelos, as nabiças, o nabo, o pepino, os pimentos, os rabanetes, o repolho, e o grandioso tomate em fim de estação. Quanto a frutas, e também por ordem alfabética, temos as ameixas, as amoras, os figos, as framboesas, as maçãs, a melancia, a meloa e o melão, a pera, os pêssegos, a milagrosa romã, e a importantíssima uva tanto para a mesa como para a adega. Claro que com as oscilações atmosféricas, como pela localização geográfica, o aparecimento destes produtos vai variando. E pelas condições novas criadas pelo homem, como as estufas, também se pode assistir a uma variedade, no tempo, do surgimento destes produtos nos mercados e consequentemente na mesa. Depois do tempo quente ainda a surpresa dos novos frutos, chamados secos, como a noz, a avelã, e a prodigiosa castanha.

 

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Nos anos setenta do século passado, XX, surgiu a grande questão, em simultâneo com a nova cozinha, do consumo dos produtos frescos tendo Paul Bocuse lançado um conceito associado à cozinha dos mercados. Isto significava que os menus deveriam ser elaborados a partir dos produtos frescos que se encontravam disponíveis nuas mercados. A ideia é boa, a forma de a executar é mais complexa pois impede grandes programações antecipadas e o preço dos pratos a correrem o risco de flutuarem constantemente. Este conceito nasceu possivelmente pelo aparecimento de muitas cozinhas inventivas e utilização de muitos produtos que passaram por uma ou várias fases de conservação. Paul Bocuse publica então o livro “A Cozinha do Mercado” que para além de novidades contém muitas receitas antigas mas aligeiradas com novos procedimentos culinários, alterando-lhe a quantidade de gorduras, transformando a receita num produto mais digestivo e aliviando os molhos para garantir a melhor apreciação da iguaria de base.

Estamos a sair da época em que a sardinha foi rainha. Bem gorda, apenas grelhada e de preferência colocada sobre pão de centeio para absorver a seu “molho”. Mas ainda tempo para o atum, a cavala, o carapau, a corvina, o goraz, o safio… Repito que hoje em dia há peixe congelado em excelentes condições. Mas atenção é tão importante a forma como se descongela, como a frescura com que ele é pescado. Nunca se deve precipitar o descongelamento. E sobretudo nunca colocar o congelado sob uma torneira de água quente para descongelar o peixe. Isso é matar a sua frescura. Quanto ao peixe nunca consegui entender muito bem, a questão, quando num restaurante se pergunta se o peixe é fresco. Fico sempre atento à resposta. Invariavelmente a resposta é não. Quem pergunta raramente saberá a diferença!

Quanto às carnes o assunto é diferente. Possivelmente porque as pessoas se habituaram a congelar a carne em suas casas. Mas a exemplo do peixe, quantas vezes se coloca o produto a descongelar dentro de água? E depois de que cor fica a água? Vermelha, que são os sucos da carne que saíram, e depois a carne fica seca e com menos gosto. Quanto a carnes eu gosto muito quando nos estabelecimentos se evidencia a origem da carne e é identificada como sendo qualificada. Temos excelentes exemplos na carne bovina, suína e caprina. Claro que não abdico de continuar afirmar que em relação ao porco, “preto” apenas é a cor e não significativo de qualidade. Quantos perguntam se é congelado ou a sua origem? Eu sei que é possivelmente mais difícil o acesso, mas é uma tranquilidade em relação à sua qualidade, e que exige pouca confeção. Para os bons produtos “cozinhar o menos possível”.

Frescos ou bem conservados acompanhados com vinho, saberão sempre melhor.

BOM APETITE!

© Virgílio Nogueiro Gomes