(Salada de Coelho com Molho de Vilão)
Estamos no verão e apetece sempre comida apaladada e fria. Desde a minha vivência em Trás-os-Montes me habituei a comer lebre e perdiz com molho de vilão. Nada mais prático e o molho de vilão faz-se muito rápido. Depois de cozer lebre ou perdiz, passa-se ligeiramente sobre o grelhador e cortam-se em pedaços. À parte prepara-se o Molho de Vilão com azeite e vinagre (de boa qualidade, naturalmente transmontanos) até conseguir que o molho fique grosso. Depois junta-se cebola picadinha e salsa, e tempera-se com sal e pimenta. Deita-se este molho sobre a carne. Se deixar de um dia para o outro, guardado no frio, fica melhor.
Encontrei este poema de Luís de Araújo (1833 – 1908) e publicado no livro “Viva a Independência da Barriga” (Almanaque do Cozinheiro), com seleção de textos de Manuela Rêgo que transcrevo:
O Molho de Vilão
É já sabido e já velho
Mas vou dizer a razão
Porque há molho de coelho,
Que é chamado de vilão
Houve um frade franciscano
Nédio servo do Senhor,
Que era exímio caçador,
Era ele e frei Caetano.
Tinha espingarda de um cano,
Todo o seu belo aparelho,
Luzia como um espelho,
Como um espelho luzia.
Que ele matava o que via,
É já sabido e já velho.
Viu um dia um coelhinho
Lá na horta do convento,
Mas sentindo-o, n’ um momento,
Abalou o tal bichinho.
Na fazenda de um vizinho
Foi meter-se o maganão,
Salta um muro o frade então,
Não atira ao ver o bicho,
Não disse se foi capricho,
Mas vou dizer a razão.
Uma moça mui corada
Mais corada que um ladrilho,
Grita-lhe: - “Dê ao gatilho…
Lá está ele na latada”.
Pum! Caiu pois à chumbada,
O frade fez-se vermelho…
E ela disse-lhe em conselho:
“Jante vossa senhoria,
Hoje em minha companhia,
Porque há molho de coelho”.
Picou então três cebolas,
E salsa verde picou,
Ambas as coisas deitou,
Num tacho, a dizer graçolas,
Assa o coelho em três bolas,
Porque não tinha carvão.
Azeite e vinagre então
Lhe deita – e piscando o olho,
Diz: - Por ser pobre este molho,
É chamado de vilão.
In Cem fados de Luiz d’ Araújo.
Esta simplicidade a ajudar a abrir o apetite.
Bom verão e não esqueçam que com vinho a comida sabe melhor.
© Virgílio Nogueiro Gomes
Foto © Adriana Freire