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Desde Fevereiro, quando tomei conhecimento da produção da alheira de bacalhau, que me interrogo sobre as razões desta tragédia. E longe que estava eu, no Brasil, e longe estava eu também de imaginar que este atentado acontecia exactamente em Mirandela.

Já me cansei de explicar que os motivos que me levaram a escrever sobre este assunto eram especialmente culturais. Cultura é um chapéu muito abrangente sob o qual metemos as tradições, hábitos continuados, integrações sociais e vertentes antropológicas.

Já referi noutra ocasião que tenho recebido manifestações de apoio para a proposta de alteração da designação do produto que é um “enchido de bacalhau”, a nível nacional, e de gente com créditos bem firmados na área da gastronomia e da história da alimentação. Por outro lado, os leitores do meu Site também se têm manifestado inclusive com legislação sobre a designação do produto “Alheira”.

Apesar de não ter formação jurídica, nem pretensões a tal, como simples leitor da nossa legislação encontrei a “Norma Portuguesa Definitiva” – NP 598 de 1969, que define os “Enchidos Portugueses, Alheira, Definição e características”. No seu Objectivo pode ler-se: “A presente norma destina-se a definir e caracterizar a alheira”.

E continuo a transcrever: “Definição. Para efeitos da presente norma, entende-se por alheira o enchido curado pelo fumo, constituído por carne de diversas espécies, por pão e gordura de porco, adicionados de certos condimentos e aditivos legalmente autorizados.

Características. Matéria-Prima. Carne. Carne de vitela, de porco e de animais de capoeira, ou de espécies cinegéticas, convenientemente desfiada. Outros produtos. Pão de trigo ou de centeio. Gorduras macias de porco. Presunto curado, desfiado. Condimentos e aditivos. Os condimentos e os aditivos adicionados devem ser homogeneamente distribuídos e constituídos por sal, pimenta, alho, azeite e, ainda, pelos condimentos usualmente utilizados nos diversos processos tecnológicos regionais.”

A Norma continua com outros detalhes relacionados com os invólucros, caracteres organolépticos exteriores e interiores, formato e dimensões, acondicionamento e marcação.

Poderão dizer-me que é uma norma de 1969. Mas não foi revogada.

Mais, pela Portaria nº 1313/93, publicada em Diário da República de 29 de Dezembro de 1993, dos Ministérios da Agricultura e do Comércio e Turismo, que “estabelece disposições ao fabrico e comercialização de carnes preparadas e enchidos de carne, no que se refere a sua definição, matérias primas e invólucros e caracteres organolépticos constantes de diversas normas portuguesas”. Esta Portaria cita como enchidos de carne: Chouriço de carne, Linguiça, Salpicão, Paio, Morcela, Chouriço de sangue, Chouriço-mouro, Cacholeira, Farinheira, Alheira, Salame, Mortadela, Pasta de fígado, Pasta de carnecarne, Salsicha fresca, Salsicha tipo Frankfurt, Toucinho fumado, Bife-de-hamburgo de bovino, Torresmos, Fiambre da pá, Fiambre da perna, Bife-de-hamburgo de aves, Filete afiambrado e Afiambrado popular.

Ora, esta Portaria, ao remeter a alheira para a NP598 de 1969, mantém-lhe a definição e características atrás descritas. E não chamemos a Portaria de antiquada pois manifesta certos modernismos ao definir até os “Bifes-de-hamburgo, vulgarmente conhecidos com hambúrgueres.

Que terá a ASAE a dizer sobre este assunto?

Pelos vistos, além das questões culturais, também devemos juntar as legais???

Vivam as alheiras tradicionais.

 

© Virgílio Nogueiro Gomes